quarta-feira, 16 de junho de 2010

O Rio

            Quero te mostrar este rio, este rio que existe nos sonhos, olha pra ele, vê tua própria face nesse cristal, vê outros rostos também, todas essas faces misturadas, passando, correndo, ele que é feito dessa água, que é a água da vida, essa vida que corre nele, ele carrega a tua vida, e a vida de todo o mundo, vê seus redemoinhos, as águas turbulentas, toda a espuma, vê seus recantos, suas paragens e cantões, essa calmaria, mas sempre em movimento, ele que não cessa de correr, vê nele o antes, o agora e o depois, ele que é feito do próprio tempo, ele carrega a tua memória, e a memória de todo o mundo, nele estão todos teus desejos, e os desejos de todo o mundo, beba dessa água, sinta seu gosto, mata tua sede, que descobre insaciável, esta sede de vida, toma coragem e põe-te em pé!, fecha teus olhos e respira fundo, lança-te no espaço e mergulha fundo, penetra seu leito até tocar esse solo de sonho, vê os peixes que nele habitam, todas as algas e vegetação e pedras, tudo que é antigo, novo ou será descoberto, todos os mortos, vivos e não-nascidos, observa atentamente, abra os braços, vai-te à tona, enxuga teus olhos e vê que este rio te carrega, te afoga no turbilhão dos teus sentimentos e na calmaria do teu cotidiano, te leva pra longe dos teus desejos, toma coragem e põe-te a nadar!, muda esse curso, teu curso não é o curso do rio, é o curso do teu desejo, cada braçada é difícil, teu corpo dói, mas te enche de vontade, uma vontade de ferro, essa vontade que é o ar que respira e dá força aos teus pulmões, coração, sangue e músculos, uma vontade  de fogo, essa vontade que te aquece, inflama e não te faz desistir, te enche de coragem e vence essa corrente, muda tua trajetória, alcança essa baía, essa baía onde está tua paz, teu amor, tua alegria e serenidade, teu passado, teu presente e futuro, e não te arrependerás deste esforço, descansará, braços e pernas abertas na superfície da água, e vê o Sol com um sorriso no rosto, até que um dia acordará, e vai-te cruzar a margem do rio, pisar na areia e mergulhar nesse Mar, que te é desconhecido.